terça-feira, 18 de dezembro de 2012

PASSEIO SOCRÁTICO - FREI BETO



Recebi por E-mail difícil não querer divulgar...
Reflexão e atitude!

 Ao viajar pelo Oriente mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos e em paz nos seus mantos cor de açafrão.

Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro café, todos comiam vorazmente. Aquilo me fez refletir: 
Qual dos dois modelos produz felicidade?

Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei:
-Não foi à aula? Ela respondeu: 
-Não, tenho aula à tarde. Comemorei:
-Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir até mais tarde.
-Não, retrucou ela, tenho tanta coisa de manhã....
-Que tanta coisa?, perguntei.
-Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina, e começou a elencar seu programa de garota robotizada.
Fiquei pensando:
-Que pena, a Daniela não disse: -Tenho aula de meditação!

Estamos construindo super-homens e super-mulheres, 
totalmente equipados, mas emocionalmente infantilizados. 

Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis
livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de
ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas
me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: 
Como estava o defunto?.
Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite! Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?

Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizinho de prédio ou de quadra! Tudo é virtual. Somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. E somos também eticamente virtuais...

A palavra hoje é entretenimento. Domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela. Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres:
Se tomar este refrigerante, calçar este tênis, usar esta camisa, comprar este carro, você chega lá! O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba, precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.

O grande desafio é começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde mental, três requisitos são
indispensáveis: amizades, auto-estima, ausência de estresse.

Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Na Idade Média, as cidades adquiriam “status” construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping center. É curioso: a maioria dos shoppings centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingo. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas...

Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. 

Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno... Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do Mc Donald...

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas:
Estou apenas fazendo um passeio socrático. Diante de seus olhares espantados, explico:
Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia:
"Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz!" frei Beto

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O OUTRO

 O OUTRO  Muitas vezes Olho o outro com desdém  Mas se esse outro  Tem um pouco de mim Porque não percebo essa semelhança? Esse outro sou eu...